Tradução
da matéria escrita por Evelyn McDonnell e publicada em 3 de maio de 2019 no
site do The New York Times
Quando o Bikini Kill entrou
no palco do lotado Palladium em Hollywood no dia 25 de abril, a banda recuperou
um pódio que tinha deixado há 22 anos. Para muitos na plateia, o show era a
primeira chance de ver a banda que eles descobriram através de livros, ou de
filmes, ou talvez até na coleção de discos de suas mães. Para outros, que era o
meu caso, foi um choque para um momento definitivo em nossas vidas. Tempo
acertado, e eu percebi: Bikini Kill é tão vital quanto eu lembrava.
Eu era um fã de punk e
jornalista com 28 anos que praticamente tinha desistido da frente do palco
quando eu entrei no número 924 da Rua Gilman em Berkeley, Califórnia, numa noite
de sábado em 1992 – ou era o que eu pensava. Em uma década indo em shows, eu
tinha sido esmagado várias vezes em mosh pits e isso me forçou em ver as bandas
dos confins seguros do fundo da plateia.
Então, eu vi o meu primeiro
show do Bikini Kill.
O número 924 da Rua Gilman é
um coletivo, de todas as idades, um espaço para performances sem lucro em
Berkeley que foi a casa do punk de East Bay desde o meio dos anos oitenta. Em
1992, admissão era cinco ou seis dólares. Cobrar mais seria capitalismo. Com uma
mão cheia de verdinhas, conseguimos ver três grandes bandas: Bikini Kill, Tribe
8 e Pansy Division.
Bikini Kill era um quarteto
que dividia seu tempo entre Washington, D.C., e Olympia, Washington, as cidades
que foram identificadas como as cidades gêmeas na matéria de capa do LA Weekly chamada
“Revolution Girl-Style Now.” O título era a letra de uma música do Bikini Kill
– a primeira linha da primeira música do autointitulado EP de estreia que a
banda lançou no dia antes do show na Rua Gilman. Identificadas como a bandeira do movimento
riot grrrl, Bikini Kill tinha muitas expectativas em seus jovens ombros em 10
de outubro de 1992.
Não o bastante, o grupo era o
mais famoso de um grupo de bandas que surgia reivindicando o punk de homens
brancos héteros. A banda queercore Pansy Division fazia o tipo de pop-punk que
alguns anos mais tarde transformaria Gilman no epicentro do D.I.Y (faça você
mesmo – do it yourself) americano através de Rancid e Green Day, porém Pansy
Division tocava de forma engraçada e incisiva. As cinco meninas do Tribe 8 também
tocavam por risos, mas sua música era um lixo inalterável. Assim como todos vocalistas
homens de punk antes dela, Lynn Breedlove tirou sua camiseta assim que a cena
esquentou – o que foi bem cedo.
A detonação de gênero da
Tribe 8 provavelmente preparou a bomba para os headliners do show. Esqueça
controle de raiva: controle de anarquia é a chave para um grande show de punk.
O simples ato de revolução do Bikini Kill era para confrontar o status quo do
punk rock desde o momento que entrou no palco. “Meninas na frente” elas
gritaram. E assim, a frente do palco era nosso.
Bem, mais ou menos. Nem todos
os homens foram de boa vontade para trás. O pushback que o Bikini Kill
enfrentou pelo seu simples ato de afirmação feminista foi documentado em
histórias sobre o riot grrrl, incluindo o documentário de 2013 “The Punk
Singer,” sobre a vocalista da banda, Kathleen Hanna. Shows eram frequentemente
interrompidos por discussões, pela necessidade de parar um membro da audiência
excessivamente agressivo, pela violência. Eu não me lembro de algo especifico
dando errado no show no Gilman. Mas eu lembro do senso de caos – que tudo podia
acontecer.
Tem alguma coisa no Bikini
Kill que desencadeia almas amarradas, para o bem e para o mal. Talvez seja o
jeito como Tobi Vail bate na bateria como se a vida de todos dependesse disso. Ou
o jeito alegre e voraz de dançar de Hanna enquanto berra de um lugar bem
profundo. Ela veste um sutiã, uma camiseta pela metade, mas até o diafragma –
as vezes com a palavra “Slut” rabiscada – era desestabilizador de um jeito que
o torso nu de Breedlove não era. Com os seus movimentos cheerleader e stripper
desconstruído, Hanna ainda tem um pé no mundo da objetificação sexual, enquanto
a vocalista do Tribe 8 atravessou para o outro lado. O straddle é competitivo e
perturbador. Como Hanna canta, “Nos seus quadris, existe uma revolução.”
O tempo não domou o Bikini
Kill, mas a sua resposta feroz para o ataque e desigualdade achou uma audiência
maior hoje daquela de um quarto de século atrás. No Palladium, Hanna vestiu um
visual de cheerleader enquanto ela levava cinco mil fãs cantar junto dela uma
retaliação para um abusivo pai: “Suck my left one.” Hanna é uma das grandes
vocalistas de todos os tempos, mas ela é melhor com essa banda atrás dela. A
batida de Vail dobra pelo baixo de Kathi Wilcox empurra a voz de Hanna para um
rugido primal e inegável; ela faz você escutar.
Shows de reunião são sempre
uma amostra de nostalgia. Mas o retorno do Bikini Kill parece menos uma
explosão do passado e mais como a intervenção de um super-herói. Suas músicas
são endereçadas para violência sexual, assedio e exclusão em maneiras que são
ao mesmo tempo catárticas e encorajadoras. Hanna fala diretamente para o atual
contexto político, dizendo para a audiência continuar firme. “Nós ainda estamos
mudando e eles não podem tirar isso de nós,” ela diz, e então manda “Resist
Psychic Death.” Palavras de sabedoria de fato.
Atos semelhantes estão mais
uma vez compartilhando o tablado com o Bikini Kill. Na noite de estreia a lenda
do punk de Los Angeles Alice Bag, com convidados especiais Allison Wolfe (Bratmobile),
Teri Gender Bender (Le Butcherettes), Francisca Valenzuela e Lysa Flores.
Bikini Kill não tentou policiar a frente do palco do Palladium. “Não precisamos
da meninas aqui na frente,” Hanna disse. “Eu acho que já tomaram conta disso.” Milhares
se amontoaram na frente dela, dançando selvagemente em um espaço que, mais uma
vez, era nosso.
Publicação original: https://www.nytimes.com/2019/05/03/arts/music/bikini-kill-live.html?smid=fb-nytimes&smtyp=cur&fbclid=IwAR1CP2OPDsYCK1C0sP2bCaKFMEbwnIekPUuJzcWz1h8VEyrYwLP68_yXcuQ
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