Pular para o conteúdo principal

O Iron Maiden vence mais uma vez no Morumbi e continua na liderança do metal




O estádio do Morumbi em São Paulo já foi palco de diversos clássicos e jogos históricos do futebol nacional. Os corintianos mais velhos até hoje não se esquecem qual foi a sensação de sair da fila após o gol de Basílio no campeonato paulista de 1977 contra a Ponte Preta de Campinas. Já os palmeirenses adoram lembrar da defesa do goleiro Marcos contra o ídolo corintiano Marcelinho Carioca na Libertadores de 2000. Isso lhe rendeu o apelido de São Marcos. Os santistas por sua vez sonham até hoje com as pedaladas mágicas de Robinho contra o lateral Rogério do Corinthians na conquista do campeonato brasileiro de 2002. Os donos da casa, os são paulinos, adoram lembrar da máquina tricolor comandada pelo mestre Telê Santana e a conquista do primeiro título da Libertadores de 1992 contra os argentinos do Newell's Old Boys.

Porém, no último domingo (6), o estádio Cícero Pompeu de Toledo foi a casa do Iron Maiden em sua visita a cidade de São Paulo, parte da turnê Legacy of the Beast, e de seus fãs, ou melhor dizendo, torcedores! Sim, pode se dizer que a trupe liderada pelo baixista Steve Harris atualmente não possui no Brasil apenas fãs, mas sim torcedores fanáticos. No mesmo nível de corintianos e palmeirenses. O amor e a devoção que essas pessoas possuem por essa banda inglesa é algo muito especial e único no mundo do metal e da música. Não consigo ver esse tipo de “religiosidade” por bandas como U2, e isso não é uma crítica que eu faço aos irlandeses e seus seguidores, apenas uma constatação. Obviamente que esse fanatismo muitas vezes pode cegar, mas isso é outro papo.



Falando sobre o show, o Raven Age, banda do filho do baixista do Maiden, aqueceu os cerca de 60 mil torcedores em uma tarde de clima mais frio na cidade de São Paulo. Será que eles acharam que estavam em Londres? O grupo, que estava divulgando seu último lançamento Conspiracy (2019), faz um metal alternativo, mais melódico e com groove, agradando boa parte dos presentes. Porém, e isso não é um demérito ao quinteto, nunca tocaria em um Morumbi lotado se não fosse por conta do fator “pai”. De qualquer forma, banda extremamente afiada e competente.

Já o Iron Maiden vem desde o ano passado, mais exatamente 26 de maio, divulgando a “Legacy of the Beast World Tour”. Ela é baseada no fraco jogo de mesmo nome que foi lançado em 2017. O setlist, que não muda durante toda a turnê, é formado por algumas músicas do jogo, portanto, a maioria clássicos do grupo desde 1980. Durante a preparação para a turnê, em entrevistas o vocalista Bruce Dickinson revelou que algumas surpresas estavam sendo preparadas e que provavelmente algumas músicas seriam apresentadas pela última vez. Em terras tupiniquins, os shows ocorreram no Rock In Rio (4), São Paulo (6) e em Porto Alegre (9).

Como é de costume, pontualmente às 20 horas, o público começou a escutar os primeiros acordes de “Doctor, Doctor” da banda UFO, grande inspiração para o som do Maiden e de quem Harris “chupou” vários elementos que até hoje são marca registrada da banda. Logo em seguida o vídeo de abertura do clipe “Aces High” tomou lugar e com as palavras inspiradores de Winston Churchill a banda colocou o pé na porta com a faixa que abre o disco Powerslave de 1984. O teatro de fantasias e sonhos que o Iron Maiden promove se iniciava naquele momento.

O legal dessa turnê, e os shows aqui no Brasil mostraram isso, é que eles conseguiram um ótimo mix de clássicos que não podem faltar (“The Trooper”, “Fear of the Dark”, “The Number of the Beast”, “Hallowed Be Thy Name” e “Run to the Hills”) com algumas músicas que geralmente não constam no setlist. Talvez o caso mais emblemático disso seja “Flight of Icarus”, que não entrava nos shows da banda desde os anos oitenta! Isso é algo que o Maiden faz com maestria. Desde 2005 eles têm como costume intercalar disco novo com turnês comemorativas, dando espaço para “deep cuts”, como os americanos dizem. Enfim, raridades.

Outro ponto muito legal é a parte visual. O show é repleto de efeitos visuais, explosões, avião gigante, chamas de fogos, um lança chamas, além das diversas trocas de roupas de Bruce, aumentando a dramaticidade do espetáculo. Realmente a Donzela de Ferro sabe como preparar um show épico.

Obviamente eu não posso me esquecer de falar da performance musical de Bruce, Steve, Dave, Janick, Adrian e Nicko. Não adianta nada duas horas de explosões e lancha chamas se na parte que interessa o sexteto londrino não consegue dar conta, correto?



Com mais de 40 anos de estrada, o Iron Maiden ainda consegue parecer tão bom quanto no começo de carreira. É claro, eles deram uma desacelerada com o passar das décadas, ninguém mais ali tem 20 anos, mas mesmo assim os velhinhos continuam dando conta do recado. Não tem como se decepcionar. As três primeiras músicas são um exemplo disso. “Aces High”, “Where Eagles Dare” e “2 Minutes to Midnight” foram compostas na primeira metade dos anos oitenta e exigem da voz de Bruce. E, mesmo após passar por um câncer de língua em 2015, ele continua tirando de letra. Já mais para o final do show, com a voz um pouco mais cansada, ele, que sabe que tem o público na palma da mão, aproveita para usar os torcedores do Maiden para cantarem o refrão de “Run to the Hills” e encerrar mais uma visita do grupo na cidade de São Paulo.

Após quinze músicas e quase rouco de cantar os versos que marcaram, e continuam marcando a minha vida, eu tenho uma certeza: show do Iron Maiden é igual a uma final de campeonato. A diferença é que no final você sabe que o seu time vai sair campeão, não importa o resultado. E isso é bom demais!

Antes de finalizar essa resenha, eu quero fazer uma crítica aos organizadores do evento. Eu poderia escolher diversos pontos que são um absurdo em shows grandes, como o preço abusivo que é praticado. Eu tenho sempre a impressão de estar adentrando em uma outra dimensão, no qual uma cerveja é cobrada em libra, porém eu ganho em real – e estamos falando de cerveja Itaipava, gente!

Mas eu quero apontar para um problema que eu já presenciei diversas vezes no estádio do Morumbi: a saída. Eu acompanhei o show na pista premium e na hora que a apresentação terminou havia apenas um pequeno portão para escoar o público que estava nesse setor para os arredores do estádio. Sabe boi a caminho do abatedouro? Então, igualzinho. Algum idiota pode dizer, “Quer conforto assiste em casa”, porém a questão é o volume de pessoas que ficam aglomeradas. Muitas no qual aproveitaram a chance para tomar uma ou outra assistindo a sua banda favorita. A chance de um acidente ocorrer é muito grande. Acho que os fãs poderiam ficar mais atentos e cobrarem os organizadores, que ganham muito dinheiro às custas de nós fãs cegos, e das autoridades que deveriam fiscalizar esse tipo de evento para evitar uma tragédia.  


Setlist:
Aces High
Where Eagles Dare
2 Minutes to Midnight
The Clansman
The Trooper
Revelations
For the Greater Good of God
The Wicker Man
Sign of the Cross
Flight of Icarus
Fear of the Dark
The Number of the Beast
Iron Maiden

Encore:
The Evil That Men Do
Hallowed Be Thy Name

Run to the Hills




Fotos: UOL

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Muito Sexo, muitas drogas e muito, mas muito Rock 'n' Roll na Netflix

Em maio de 2001 foi lançada uma das melhores e mais aguardadas autobiografias sobre uma banda de rock. Em mais de 400 páginas, “The Dirt: Confessions of the World's Most Notorious Rock Band” conta, através da visão de Tommy Lee, Mick Mars, Vince Neil e Nikki Sixx, a história de uma das bandas mais insanas dos anos oitenta, o Mötley Crüe. O sexo, as drogas, as brigas, as prisões, o sucesso, a decadência, tudo está nessa obra que é extremamente bem-acabada graficamente.     O papo para tornar todas essas páginas em filme começou em 2006, quando a Paramount e a MTV adquiriram os direitos para a adaptação nas telonas. Porém as coisas enfriaram e, com o fim da banda (será?!) em 2015, os rumores de que a história da banda poderia de uma vez por todas ser lançada voltou à tona. Com o sucesso no ano passado de “Bohemian Rhapsody”, o filme que conta a vida do Queen, a plataforma digital de streaming de filmes e séries Netflix lançou no dia 22 de março “The Dirt”, dirigido por

Como Henry Rollins entrou para o Black Flag

  O trecho abaixo foi retirado do livro “Get in the Van” escrito por Henry Rollins e lançado em 1994. Como o livro não tem uma tradução para o português, as linhas abaixo foram traduzidas de forma livre por mim. Espero que gostem.   Primavera (1981): Eu estava vivendo em um apartamento em Arlington, Virginia, bem perto de Washington, DC. Eu trabalhava numa sorveteria e caminhava até o meu trabalho todos os dias. Eu era o gerente da loja e trabalhava lá entre 40 e 60 horas por semana fazendo os depósitos, contratando, despedindo, fazendo inventário, servindo sorvete, etc. Eu estava numa banda naquela época. Nada muito musical. Quatro de nós com um equipamento de merda, mas a gente se divertia tocando e ensaiando. Um cara chamado Mitch Parker deu para mim e para o meu amigo Ian MacKaye uma cópia do EP do Black Flag Nervous Breakdown . Nós tocámos ele o tempo todo. Era pesado. A arte da capa dizia tudo. Um cara com as costas para a parede erguendo os punhos. De frente para ele ou

Dicas de quarentena #147: Lô Borges tocando disco do tênis na íntegra!

  Lô Borges foi um dos principais nomes que surgiram por conta do disco Clube da Esquina de 1972. Seu autointitulado álbum de estreia, mais conhecido como “disco de tênis”, é considerado por muitos críticos e fãs com um dos grandes álbuns da história da nossa música. Em 2018, Lô reuniu uma banda de primeira para recriar esse trabalho ao vivo. Abaixo você confere o show que rolou no icônico Circo Voador e que gerou o DVD “Tênis + Clube - Ao Vivo no Circo Voador":