Formado
no final dos anos setenta na Califórnia, o Black Flag é considerado por muitos
como umas das principais bandas de hardcore do mundo. Com sete discos de
estúdios nas costas, os caras são responsáveis por influenciar um caminhão de
bandas que surgiram nos anos subsequentes, como Red Hot Chili Peppers,
Metallica, Slayer, Mudhoney e Green Day, para citar algumas. Misturando punk,
blues, jazz, heavy metal, free jazz, entre outros estilos, a banda até hoje é
reverenciada.
Com
mais de 40 anos de carreira, a banda nunca tinha vindo para o Brasil, mas isso
teve um fim no último domingo (08) na cidade de São Paulo. Na verdade, o show
deveria ter ocorrido no começo de julho do ano passado, mas por motivos que até
agora não ficaram muito bem esclarecidos, pelo menos publicamente, o show foi
remarcado para o último dia 8 de março. Mas isso não impediu os fãs de comparecerem
ao Carioca Club para uma noite histórica.
A
ausência do grupo em solo tupiniquim talvez tenha uma explicação. O auge da
banda foi nos anos oitenta, mais ou menos na primeira parte daquela década. Por
se tratar de um grupo do underground americano, é bem possível que os
produtores brasileiros da época não tenham se interessado em promover um show
dos caras por aqui. Além disso, o Black Flag só voltaria as atividades quase
trinta anos após o seu fim em 1986. Desde 2013, a banda tem feito shows nos
Estados Unidos e na Europa com o skatista e músico Mike Vallely nos vocais,
além, claro, do guitarrista e membro fundador Greg Ginn.
Com
um Carioca cheio, o logo da banda apareceu no fundo do palco, era um sinal de
uma noite histórica. O desenho que foi concebido pelo irmão de Greg, Raymond
Ginn, talvez seja uma das artes mais icônicas que existem no mundo da música.
Pessoas até os dias atuais tatuam as quatro barras, que emulam uma bandeira
tremulando, em homenagem a banda.
Com
cerca de 40 minutos de atraso, o Black Flag subiu ao palco com “Depression”,
música do primeiro disco de estúdio da banda, o clássico Damaged de 1981. Mesmo com o atraso, o público enlouqueceu quando
Mike Valley começou a cantar os versos da música, “Right here, all by myself, I
ain't got no one else”. O show continuou com mais uma pedrada, “No Values” do
EP Jealous Again, o segundo
lançamento do grupo em 1980 que ainda contava com Ron Reyes como vocalista, um
dos tantos caras que fizeram jus ao posto, assim como Mike.
A
banda californiana tem em sua história alguns vocalistas icônicos, como Keith
Morris, que depois de sair da banda no fim dos anos setenta fundou o Circle
Jerks, outro grupo fundamental do hardcore americano. Mas, talvez, o que remeta
mais ao Black Flag seja Henry Rollins. Com seu estilo agressivo e maníaco-depressivo
de cantar, além de geralmente vestir nos shows ao vivo apenas uma sunga, como
se estivesse numa prancha de surfe, o cara gravou seis discos de estúdio em
quatro anos. Algo inimaginável nos dias atuais. Com tanta responsabilidade nas
costas, Mike parece entender o legado que o acompanha no posto de vocalista do
Black Flag. Ele tem seu próprio estilo, não tenta imitar aqueles que já
estiveram no lugar dele, mas mesmo assim parece encaixar e fazer jus a músicas
como “Rise Above”, “Six Pack” e “Gimmie Gimmie Gimmie”. Além disso, o cara era
simpatia pura. Brincou com o público, cumprimentou os fãs entre uma música e
outra, enfim, ganhou aqueles fãs mais desconfiados.
A
banda de Greg Ginn tocou por quase uma hora e meia, seguindo o mesmo setlist
das apresentações na Colômbia, Chile e Argentina, recheado de músicas dos dois
primeiros EPs (Nervous Breakdown e Jealous Again) e do primeiro disco (Damaged). Ginn é o único membro original
nessa nova formação. O nome da banda pertence a ele, algo que gerou muita
polêmica e processos na última década com seus antigos companheiros. Deixando
essa questão de lado por um minuto, ver o cara tocando ao vivo é insano. Influenciado
por tantos estilos de música, desde da improvisação do free jazz de John
Coltrane, passando pelo proto-punk dos Stooges, o cara tem uma técnica apurada,
mas mesmo assim parece tocar de forma simples e descompromissada. Faz sentido
ele ter influenciado uma geração de guitarristas que não queriam ser Jimmy Page
ou Jeff Beck. Sem falar que ele era outro na banda que era só sorrisos com o
público. Antes do show, extremamente simpático, ele estava tirando fotos e
cumprimentando os fãs, algo que se repetiu quando a apresentação terminou.
Com
uma versão estendida e recheada de improvisos de “Louie Louie”, o Black Flag
terminou o show de forma memorável. Mais de quatro décadas de espera que
valeram a pena. Com Joseph Noval no baixo e Isaias Gil na bateria, emulando de
forma honesta e segura a cozinha que já teve Chuck Dukowski e Robo, essa
formação da banda tem como principal objetivo celebrar toda a carreira de um
dos gigantes do hardcore.
Depois
de uma noite como essa, catártica, resta torcer para que Ginn tenha entendido o
amor do Brasil pelo Black Flag e que eles não demorem muito para voltar, ou,
quem sabe, o FLAG, banda formada por ex-integrantes do grupo, como Morris e
Dukowski, se animem para uma visita. Quem sabe, né?!
Fotos:
Drico Galdino
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