Pular para o conteúdo principal

Quando me apaixonei por Elis Regina




Durante muitos anos eu fui um fã de música de cabeça pequena, sabe aquele tipo de metaleiro que a única coisa que presta na música é o Iron Maiden? Então, eu era mais ou menos assim. Mas, felizmente, eu não sou poste e adquiri gosto por vários outros estilos de música, como a MPB e o jazz. Sim, Bruce Dickinson e companhia continuam sendo uma das minhas bandas preferidas da vida, mas eles convivem muito bem com a música de Caetano Veloso e Miles Davis em meu coração.

Procurando por sons brasileiros que fossem de agrado para o meu ouvido, não foi muito difícil dar de cara com uma gaúcha de Porto Alegre com pouca estatura, mas de muita presença e voz. Se você por acaso ainda não percebeu de quem eu estou falando, apesar de que o título desse artigo dar algum tipo de pinta, é de Elis Regina! Aqui eu quero compartilhar com você, caro leitor, três momentos no qual a Pimentinha conquistou o meu coração.

Meu “caso” com Elis começou quando eu comprei a biografia dela escrita pelo talentoso jornalista do Estadão Julio Maria “Elis Regina - Nada Será Como Antes” (eu já falei desse livro aqui no Geleia e você pode conferir aqui). Foi aqui em que eu pude entrar nos detalhes de sua vida. Do seu início no O Clube do Guri, na Rádio Farroupilha, até os maiores palcos desse país e do exterior, passando por sua trágica morte, Julio lançou provavelmente uma das melhores biografias a respeito de uma artista nacional. O jeito de ser de Elis, determinada, dona de si em uma sociedade extremamente machista, me conquistaram. No livro existe uma parte em que o jornalista transcreve uma carta que a cantora escreveu para o primeiro filho João Marcello Bôscoli assim que ele nasceu. É algo lindo, delicado, doce, mas ao mesmo tempo mostrando como ela também era frágil, assim como todos nós.



O segundo momento eu dedico, claro, para a sua voz. Eu poderia citar vários discos dela que eu simplesmente idolatro, como o seu trabalho com o Tom Jobim, Elis & Tom de 1974, ou Elis de 1972, mas aquele que provavelmente vai ficar eternamente em meu coração como meu favorito é Falso Brilhante de 1976. O disco foi baseado no espetáculo de mesmo nome, protagonizado por Elis, que ficou em cartaz por quase dois anos (1975-1977). O álbum abre com duas canções de Belchior, "Como Nossos Pais" e "Velha Roupa Colorida". A primeira é um tiro de pura emoção e voz em que não há como não se perguntar se “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”. A segunda mostra como a gaúcha teria se saído se, ao invés de ter ido para o lado da MPB, ela tivesse entrado com tudo no rock n’ roll nos anos setenta. Talvez a minha música preferida dela, César Camargo Mariano tem papel muito importante no disco e nessa música. Além desses dois clássicos, seguimos ainda com ótimas composições de João Bosco e Aldir Blanc ("Um por Todos", "Jardins de Infância" e "O Cavaleiro e os Moinhos"), da compositora chilena Violeta Parra (“Gracias a la Vida), Chico Buarque (“Tatuagem”) e aquele que talvez será sempre um dos grandes sucessos de Elis, “Fascinação”.

Caramba, que disco!



O terceiro e último momento que eu escolhi compartilhar pode parecer um pouco superficial e contraditório, mas eu vou explicar e tentar me fazer entender.

Na minha opinião, a nossa rica música brasileira não precisa de um selo internacional de qualidade para que ela seja reconhecida como boa. Isso é bobagem. Por exemplo, Rita Lee em 1975 lançou Fruto Proibido, provavelmente um dos cinco melhores discos daquele ano em todo o mundo!!! 

Porém, eu abro uma exceção para essa história de “selo internacional de qualidade” quando que está dando esse selo é o Bob Dylan. Se você conhece um pouco de música, sabe que Bob é um dos maiores compositores e gênios de toda a história da música. Em 2008, durante seu programa de rádio Theme Time Radio Hour, ele apresentou “Aquarela do Brasil” na voz de Elis. Como tema "Around The World", Dylan selecionou 14 músicas, de artistas como, Edith Piaf, Beatles e The Pogues. Além de incluir a música, o músico rasgou elogios para, como ele diz, "The Little Pepper”.



Eu acho que ser reconhecida por um dos “Pelés” da música não é nada mau, certo?

Bem, é isso, aqui eu mostrei três momentos muito importantes para mim que fizeram com que eu me apaixonasse por Elis Regina. Sim, eu puxei o saco dela durante todo esse texto, porém ela merece todos os elogios e homenagens possíveis.

Ah, antes que eu me esqueça, vale a pena assistir ao filme Elis  lançado em 2016 e que conta com a belíssima e talentosíssima Andreia Horta no papel da cantora. Não é uma obra prima do cinema moderno, longe disso, mas o espectador consegue ter uma noção de como foi o furacão chamado Elis Regina.



Ah, antes que eu me esqueça mais uma vez, em uma entrevista no início dos anos oitenta ela fala abertamente a respeito do aborto, de modo corajoso e muito à frente do seu tempo. Se hoje isso ainda é tabu, imagina naquela época. Vale a pena conferir.



Viva Elis!



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Muito Sexo, muitas drogas e muito, mas muito Rock 'n' Roll na Netflix

Em maio de 2001 foi lançada uma das melhores e mais aguardadas autobiografias sobre uma banda de rock. Em mais de 400 páginas, “The Dirt: Confessions of the World's Most Notorious Rock Band” conta, através da visão de Tommy Lee, Mick Mars, Vince Neil e Nikki Sixx, a história de uma das bandas mais insanas dos anos oitenta, o Mötley Crüe. O sexo, as drogas, as brigas, as prisões, o sucesso, a decadência, tudo está nessa obra que é extremamente bem-acabada graficamente.     O papo para tornar todas essas páginas em filme começou em 2006, quando a Paramount e a MTV adquiriram os direitos para a adaptação nas telonas. Porém as coisas enfriaram e, com o fim da banda (será?!) em 2015, os rumores de que a história da banda poderia de uma vez por todas ser lançada voltou à tona. Com o sucesso no ano passado de “Bohemian Rhapsody”, o filme que conta a vida do Queen, a plataforma digital de streaming de filmes e séries Netflix lançou no dia 22 de março “The Dirt”, dirigido por

Como Henry Rollins entrou para o Black Flag

  O trecho abaixo foi retirado do livro “Get in the Van” escrito por Henry Rollins e lançado em 1994. Como o livro não tem uma tradução para o português, as linhas abaixo foram traduzidas de forma livre por mim. Espero que gostem.   Primavera (1981): Eu estava vivendo em um apartamento em Arlington, Virginia, bem perto de Washington, DC. Eu trabalhava numa sorveteria e caminhava até o meu trabalho todos os dias. Eu era o gerente da loja e trabalhava lá entre 40 e 60 horas por semana fazendo os depósitos, contratando, despedindo, fazendo inventário, servindo sorvete, etc. Eu estava numa banda naquela época. Nada muito musical. Quatro de nós com um equipamento de merda, mas a gente se divertia tocando e ensaiando. Um cara chamado Mitch Parker deu para mim e para o meu amigo Ian MacKaye uma cópia do EP do Black Flag Nervous Breakdown . Nós tocámos ele o tempo todo. Era pesado. A arte da capa dizia tudo. Um cara com as costas para a parede erguendo os punhos. De frente para ele ou

Dicas de quarentena #147: Lô Borges tocando disco do tênis na íntegra!

  Lô Borges foi um dos principais nomes que surgiram por conta do disco Clube da Esquina de 1972. Seu autointitulado álbum de estreia, mais conhecido como “disco de tênis”, é considerado por muitos críticos e fãs com um dos grandes álbuns da história da nossa música. Em 2018, Lô reuniu uma banda de primeira para recriar esse trabalho ao vivo. Abaixo você confere o show que rolou no icônico Circo Voador e que gerou o DVD “Tênis + Clube - Ao Vivo no Circo Voador":